terça-feira, 9 de agosto de 2011
Meu lado Massaranduba
terça-feira, 11 de janeiro de 2011
Minha saga para ver Emininhaus
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
Crianças super sinceras
Os bichos e eu
domingo, 31 de outubro de 2010
Porque votei na Dilma
Descobri na semana passada, durante uma aula sobre Escolarização e Pobreza no mestrado, que quando criança era mais pobre do que imaginava ser. Um dos indicadores de pobreza daquela época era fazer parte da lista da caixa escolar, para receber especialmente livros e uniforme. Não tinha dimensão da situação familiar na época. Meus pais trabalhavam duro, mas não faltavam comida nem o velho ritual da compra de roupas no final do ano. Para mim era do jogo.
Quando me tornei adolescente a coisa complicou. Quis entrar para um time de vôlei juvenil, mas não tinha o par de tênis adequado. Ver a minha irmã fazer um crediário, em sei lá quantas vezes, doeu, incomodou. Graças a um bom senso tirado não sei de onde, nunca culpei meus pais. Via minha mãe acordar todos os dias às 6 da manhã, fazer a marmita e ir para o trabalho naquele trem apertado, apelidado de lata de sardinha. Enquanto isso, meu pai – que pesava em torno de 50 quilos – se espremia no 921 (Parada de Lucas – Bangu) para enfrentar uma rotina de 10, 12 horas num escritório em uma das várias fábricas de roupas em que trabalhou. Eu não me achava no direito de pedir um centavo sequer para comprar o par de tênis luxuoso e assim satisfazer o meu desejo de jogar voleibol. A saída foi trabalhar.
O primeiro emprego, aos 14 anos, foi numa loja de camisas de surfista numa galeria em Madureira. Depois, fui caixa em uma loja de borracha, auxiliar de escritório em uma grande marca de produtos esportivos (lugar de experiência traumática), auxiliar de departamento pessoal em uma fábrica de papel, secretária em uma empresa de andaimes, secretária em uma grande seguradora e, finalmente, vendedora de seguro. Durante todo esse tempo, eu alimentava um sonho: ser jornalista.. e de tevê. Gostava do Aqui em Agora exibido pelo SBT (sonhos, fazer o quê..) e, para isso, sabia que precisaria ingressar numa faculdade. Mas faculdade era sonho de rico e não foram poucas as vezes em que ouvi de amigos e até mesmo de familiares (não era maldade, era falta de conhecimento) que eu tinha mania de sonhar alto. Ir para tevê então? Ninguém ria, mas acho que ninguém acreditava.
Se tive que fazer o ensino médio particular porque não consegui vaga na rede pública, imagina a faculdade. Claro, a faculdade foi conquistada com o suor de um daqueles empregos lá de cima. Sim, foi particular. Ao longo desse período, conselhos mil eu ouvi: guardar o dinheiro da mensalidade e investir em um negócio próprio, fazer faculdade de secretariado porque era mais fácil de arrumar um emprego como secretária e por aí vai... Graças a uma professora de Língua Portuguesa que conheci na quinta série, eu não dei ouvidos a nenhum desses conselhos. Só lembrava de uma frase de incentivo dela, algo como “ você vai chegar muito longe, vai desenvolver algum trabalho em que vai falar pra muita gente”. Sim, ela era espírita, mas essa frase foi dita depois de eu escrever um trabalho de 4 ou 5 páginas sobre o teatrólogo Gil Vicente. Seu incentivo foi como uma mantra. Por frases como essa e por outros motivos que só a análise explica, nunca deixei que ninguém dissesse que eu não poderia chegar lá.
Mas afinal, o que tudo isso tem a ver com a votação de hoje? Porque durante muito tempo ouvi dizer que todas as minhas conquistas foram pela minha força de vontade, mérito pelo meu esforço. Sim, eu me esforcei, mas foram inúmeras as vezes em que tive vontade de desistir, de deixar pra lá esse negócio de querer “ser alguém na vida”. Nos dias em que os ônibus não paravam e eu chegava atrasada no trabalho, no dia em que fiquei na porta da escola sonhada para cursar o bom ensino médio e não consegui a vaga, no dia em que aquela empresa traumática que citei lá em cima me mandou embora por motivos não explicados. Mas eu sabia qual era. Depois de um bom desempenho no almoxarifado fui colocada no controle de estoque de peças com defeito e, para botar ordem na bagunça, decidi fazer uma limpeza, isso mesmo limpeza igual na casa da gente. Coloquei uma bermuda de lycra e uma camiseta e fui organizar as peças. Um gerente me viu com a bermuda de lycra e achou que fazia parte do estoque da própria empresa. Conclusão não dita, mas estampada nos olhos do gerente: pobre com roupa de rico só pode ser roubada. Como não tinha noção de direitos, não recorri a nada. Só chorei!
O choro não durou muito. Consegui outro emprego logo em seguida. Mas o fato é que tem gente que não consegue parar de chorar. Recuperar autoestima não é tão fácil como supõem os livros de auto-ajuda não. E é por essas e outras que a meritocracia não funciona. Esse negocio de quem se esforça chega lá é conversa de rico para a empregada doméstica continuar trabalhando como escrava. É preciso oferecer oportunidades reais para todos. E eu vi essas oportunidades existirem nos últimos 8 anos. Se algumas delas tivessem ao meu dispor durante a minha juventude, talvez ninguém fizesse cara de descrédito quando eu dizia que iria ser apresentadora de tevê.
PS.: esse desabafo não quer dizer que não há o que melhorar. Mas basta entrar numa universidade pública hoje e ver que muita coisa já mudou. A começar pela diversidade.